Juízos Morais

Uma das tarefas mais importantes para a ética é o julgamento moral dos atos individuais. O juízo moral seria algo simples se houvessem padrões objetivos e facilmente compreensíveis que pudessem ser utilizados. Na sua ausência, alguns aspectos precisam ser considerados para auxiliar a pessoa ao julgar moralmente tanto suas próprias ações quanto as das demais. A lista abaixo não pretende ser exaustiva, tampouco se constitui em um guia de ação, mas esclarece alguns conceitos úteis, e se baseia nos trabalhos de Alasdair MacIntyre e Jaime Balmes.

            Em primeiro lugar, deve-se considerar o agente moral em si. A ética é um produto da razão humana, portanto, o agente moral precisa ser uma pessoa com plena capacidade de refletir e compreender o que está envolvido, uma pessoa que tenha condições de formular alternativas de ação, analisar criticamente cada uma delas e tomar uma decisão autônoma em relação ao que fazer. Diretamente associada à razão, neste caso, está a autonomia. O agente moral precisa ser livre para fazer uma escolha, e essa escolha deve ser ditada pela sua própria razão e não determinada por terceiros.

Em seguida, é preciso que exista uma concepção do bem devidamente articulada. O bem se manifesta de duas formas na ação humana, uma delas substantiva, que é intrínseca à ação em si – ou seja, existem ações que podem ser consideradas intrinsecamente boas porque realizam algo que permite o florescimento humano – e outra instrumental, em que se verifica se o resultado é bom para o agente e/ou as pessoas ao seu redor. Assim sendo, uma ação em que a virtude da caridade seja praticada pode ser considerada intrinsecamente boa, trazendo um bem ao agente que pode ser descrito como algo que o torna melhor do que seria se não o praticasse (ou seja, ele é melhor por agir assim), ao passo que uma ação como dar a um mendigo uma esmola maior do que a dos amigos dão para granjear sua admiração produz um resultado bom para o recipiente e torna admirável o doador – mas ela foi pensada para gerar esse bem, não por ser boa em si. O aspecto mais importante é que essa concepção do bem possa ser apresentada e racionalmente defendida, ou seja, é possível argumentar em seu favor e defendê-la perante as alternativas.

Outro elemento essencial é o contexto da ação. O agente moral deve ser uma pessoa dotada de informações sobre as condições da situação que vivencia, ou seja, deve ter conhecimento (ainda que imperfeito) sobre o que está envolvido naquela situação, e, sendo racional, deve ser capaz de compreendê-la. Uma ação empreendida em um contexto em que nenhuma alternativa era possível precisa ser avaliada de maneira distinta daquelas em que outras possibilidades de agir se apresentam ao agente. Por exemplo, em um combate, um soldado que avance contra o inimigo, com forte risco de morte, poderia ser moralmente avaliado por meio da virtude da coragem – mas se ele o faz porque recebeu ordens para tanto, estaria apenas exercendo a obediência. O agente deve ter conhecimento do contexto para decidir como agir – e esse conhecimento é também crucial para quem julga moralmente a ação.

Um juízo moral, dessa forma, deve ser feito considerando-se que uma ação foi empreendida pelo julgador ou por outra pessoa, de maneira racional, autônoma e suficientemente informada, e essa ação visava a produzir um bem que pode ser definido, discutido e defendido, sempre considerando-se em que situação a ação se deu. Veja-se que não se falou aqui da motivação do agente, simplesmente porque se considera que o motivo de qualquer ação, eticamente falando, é o bem. É verdade que, se uma ação é intrinsecamente boa, o contexto não importa para definir se ela é ética, mas sempre se pode questionar se é possível realizá-la naquele momento e lugar. Ao julgar moralmente uma ação, é essencial ter elementos que permitam compreender o que foi feito e porque foi feito, e a pequena lista apresentada aqui fornece um ponto de partida.Mas, antes de terminar, uma ressalva: se você estiver julgando a ação de outra pessoa, é importante discutir o juízo que está formando com ela, pois novas informações podem jogar luz sobre o que ocorreu. Mas, mesmo que não surjam novas informações, o diálogo é sempre um aprendizado – e a ética envolve aprender a viver para alcançar (e fazer) o bem.

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