Liberdade, descentralização e desburocratização

O que torna um homem livre senão a capacidade de poder fazer as suas escolhas? Do Estado, espera-se a condição para o indivíduo exercer a sua liberdade e proteger sua vida e propriedade. Não basta, porém, que a nação assegure a liberdade no plano político, é imperioso que ela se estenda ao quotidiano do cidadão. Uma Administração Pública complexa e centralizada, tipicamente burocrática, afasta o homem comum da esfera pública, além de elevar o risco de opressão estatal.

Tocqueville (1998) alerta que os sujeitos, quando abrem mão de dirigirem suas vidas, escolherem seus representantes e gerirem seus problemas, para transferir as decisões a um burocrata, perdem a aptidão de escolher aqueles que deveriam conduzi-los, tornando-os um povo de servos. Para o autor, a centralização político-administrativa é um obstáculo à cidadania e ao desenvolvimento da liberdade política, em que o “soberano estende os braços para abarcar a sociedade inteira, e cobre-a de uma rede de pequenas regras complicadas, minuciosas e uniformes, através da qual mesmo os espíritos mais originais e as almas mais fortes não conseguirão romper” (TOCQUEVILLE, 1998, p. 273). 

A distância entre governantes e governados pode ser mensurada através da possibilidade de o cidadão praticar suas ações livremente e de ser capaz de se envolver com a polis. Nesse sentido, Tocqueville (1998, p.389) aponta que: “Quando o público governa, não há homem que não sinta o preço do bem-estar público e que não procure cativá-lo, atraindo para si a estima e a afeição daqueles em cujo meio devem viver”.

A capacidade de pensar e tomar decisões limitadas à administração central desestimula o espírito de liberdade e participação dos cidadãos. Evidente que as mazelas de uma nação são sentidas na ponta por aqueles que vivenciam a situação. Assim, a destreza do governo local ou de particulares seria muito mais eficaz, inovadora, ágil e econômica para resolver determinados assuntos. Ademais, a concentração de poder em nível federal leva a morosidade das soluções, inchaço do aparato burocrático e esvaziamento da autoridade periférica (BELTRÃO, 1984).

Dentro da perspectiva da Nova Gestão Pública, Osborne e Gaebler (1995) indicam que a descentralização da autoridade abre espaço para um gerenciamento participativo, possibilitando uma ação conjunta entre a sociedade civil organizada, o setor público e o setor privado. Já na ótica do Novo Serviço Público, o homem é um ser político disposto a agir na comunidade, cujo juízo moral é construído a partir da discussão pública (SALM E MENEGASSO, 2009). Outrossim, embora haja divergências epistemológicas nas teorias de Administração Pública, a descentralização é um elo em comum.

A burocracia, portanto, não abre espaço para a descentralização nem para as escolhas individuais. Desse modo, cabe investigarmos os caminhos com mais ou menos centralização, e que irão levar para lugares tão distintos.

REFERÊNCIAS:

BELTRÃO, Hélio. Descentralização e Liberdade. Rio de Janeiro: Record, 1984.

OSBORNE, David; GAEBLER, Ted. Reinventando o governo: como o espírito empreendedor está transformando o setor público. Brasília: MH Comunicação, 1995.

SALM, J. F.; MENEGASSO, M. E. Os modelos de administração pública como estratégias complementares para a coprodução do bem público. Revista de Ciências da Administração, v.11, n. 25, p. 97-114, set/dez 2009. 

TOCQUEVILLE, Alexis de. A Democracia na América. Tradução de Eduardo Brandão. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

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