O filósofo espanhol Leonardo Polo (1926-2013) afirmou em seu livro Ética: Hacia una versión moderna de los temas clásicos (Eunsa, 2018) que “destruir a linguagem é impossibilitar a cooperação humana e, portanto, dificultar o desenvolvimento e a organização do trabalho humano”. E continua: “costumo dizer que o subdesenvolvimento não é uma consequência da incapacidade; o subdesenvolvimento é a consequência de mentir demasiadamente, que as pessoas não confiam em ninguém”. No campo da Economia e das outras ciências sociais já é bastante conhecida a relação entre desenvolvimento econômico/social e a confiança, principalmente a confiança interpessoal (capital social) e institucional.
Um elemento talvez original que Polo esteja trazendo é atribuir ao vício da mentira uma importância central para o subdesenvolvimento. Vejamos.
A linguagem e a comunicação são elementos vinculadores da sociedade, tanto que Polo define a sociedade como “uma relação ativa, comunicativa, entre as pessoas.” Mas essa comunicação pode ser de qualquer modo? Não pode, pois a linguagem precisa ser acreditada, ou seja, ter elementos de verdade. Caso contrário, a linguagem se destrói e, com ela, as relações sociais humanas. Para que a linguagem possa ser acreditada, ela deve ser empregada segundo a virtude da veracidade. De acordo com Juan Fernando Sellés, em sua obra Antropologia para inconformes, ela é uma “virtude da instância da vontade que tem como fim manifestar a verdade conhecida”. Na medida em que falamos a verdade – sem subterfúgios como “uma mentirinha não faz mal a ninguém” – estamos fazendo com que essa virtude seja cultivada, e dessa forma nosso caráter se torne mais estável. E um caráter mais estável é a fonte de nossa confiança interpessoal, pois neste caso as pessoas poderão “acreditar plenamente, com firmeza” uma nas outras – que é precisamente a etimologia da palavra confiança (do latim confidere).
Quando a mentira se torna parte da linguagem social, e em alguns casos até valorizada, os vínculos sociais se tornam desconfiados, já não mais “acreditando com firmeza” uns nos outros, mas tornando-se um jogo estratégico para alguns e cínico para outros. A dissimulação começa a fazer parte dos atributos sociais de uma pessoa bem-sucedida, e aquela que insiste em exercitar a virtude da veracidade é considerada como ingênua. Em outras palavras, a mentira como linguagem converte a virtude em vício, e o vício em virtude. Em um ambiente assim, a confiança interpessoal se dilui, permanecendo talvez apenas em pequenos círculos restritos. E, como sabemos, a falta de confiança além destes círculos faz parte da receita do subdesenvolvimento.