Humanidade e Inteligência Artificial 

Se existe uma característica que é própria do ser humano e que o diferencia de todos os outros seres viventes, esta é a sua humanidade. Um conjunto de atribuições que o torna capaz de agir com benevolência, bondade e compaixão para com o outro, pensar, refletir e agir com racionalidade. Tais qualidades quando realizadas em sua plenitude tornam o homem humano.

Dentro da condição humana, o homem tem a necessidade do outro. Relacionar, conviver, atribuir afeto, resolver problemas e conflitos fazem parte da sua realidade natural. Entretanto, em virtude do crescente consumo de artefatos tecnológicos, o outro, por vezes, tem se tornado periférico cedendo lugar a diferentes tipos de tecnologia. O contato que antes era exclusivo entre pessoas transforma-se na relação unilateral da pessoa com a tecnologia, impedindo o desenvolvimento de importantes virtudes e qualidades individuais que precisam de um contexto social para que sejam aperfeiçoadas.

Com o aprimoramento da tecnologia, em especial a Inteligência Artificial, é importante compreender que o ser humano possui a tendência de atribuir desejos e sentimentos aos artefatos tecnológicos mesmo que eles não possuam nenhuma habilidade de sentir algo. Ou seja, pessoas que não são, tem conhecimento dos estados de desenvolvimento internos dos mecanismos de IA, assumirão que as máquinas possuem estados de desejos e sentimentos semelhantes aos seus. Essa associação é conhecida como antropomorfismo. Em virtude da conexão emocional unidirecional, as pessoas têm se equivocado ao depositar demasiada confiança e sentimentos a essa tecnologia. 

O antropomorfismo pode gerar sentimentos positivos para com dispositivos que utilizam a IA, especialmente robôs. Esses sentimentos podem ser confundidos com amizade, pois os indivíduos têm a tendência de designar atributos humanos a objetos não-humanos. O relacionamento entre esses objetos e pessoas pode levá-las a níveis ainda mais profundos de solidão (Bartneck et al., 2020). Mesmo que os robôs demonstrem interesses, preocupações e cuidados com uma pessoa, eles não são capazes de sentir emoção. A antropomorfização da IA tem se tornado realidade e seus impactos podem ser notados no enfraquecimento dos relacionamentos entre pessoas e no espelhamento de expectativas irrealistas dos indivíduos que desejam que o outro se comporte como um robô artificialmente inteligente (Bartneck et al., 2020). 

A IA é uma ferramenta que serve ao ser humano e não é capaz de suprir suas necessidades mais profundas, uma vez que precisam de um outro para que sejam concretizadas. É preciso ter cautela ao utilizar artefatos de IA a fim de não atribuir qualidades unicamente humanas a elementos tecnológicos. É necessário sempre relembrar que as atribuições únicas do ser humano se desenvolvem na dimensão dos relacionamentos interpessoais. 

A antropomorfização de certos artefatos tecnológicos levanta sinais de alerta, uma vez que inibe o desenvolvimento de virtudes no indivíduo, tornando perceptível a inversão de certos papéis: pessoas influenciadas pelo imediatismo e previsibilidade resultantes da interação unilateral entre indivíduos e tecnologia e menos parecidas com a própria essência de ser humano. 

Referência

Bartneck C, Lütge C, Wagner A, Welsh S (2020). An Introduction to Ethics in Robotics and AI. Springer.

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